Tradução: sarajevo
A distinção é entre dois modos de debate. O debate tradicional reflete as regras de procedimentos intelectuais associados ao Iluminismo, às quais a maioria das transformações da humanidade dos últimos cem anos, boas e más, podem ser atribuídas, mas que remetem à Grécia antiga.
O segundo modo, temporalmente mais recente, é o do debate pseudo-intelectual, que é relativista, construtivista, de mentalidade anticientífica e da inversão massiva dos valores do Iluminismo, que surgiu através de meados da década de 60 através do braço político do movimento feminista.
O debate tradicional
A seguir estão às dez principais características do debate tradicional, que muitos professores e estudantes ainda hoje consideram a forma normal ou padrão para pensar, estudar e discutir:
• "Desprendimento pessoal das questões em discussão," a separação de identidades pessoais dos participantes dos temas de investigação ou dos temas de debate;
• Valores de "confiança, originalidade, antagonismo, independência de pensamento [do consenso], criatividade, assertividade, domínio dos sentimentos, bom embasamento e alta tolerância para o desconforto próprio e o dos outros";
• ajustado a um espaço heterotrófico como uma classe da universidade, revista acadêmica, ou sessão de uma conferência, um lugar à parte como um campo de atuação para eventos esportivos, no qual os concorrentes são envolvidos num ritual de combate antes de retornarem com um aperto de mão para o reino da amizade, sem que haja a perda da interação pessoal;
• a forma ilustrada pelo debate na Câmara Britânica dos Comuns;
• simbolizadas pelos debates de um século entre o socialista GB Shaw e o distributista G. K. Chesterton;
• a ludicidade é legítima: é possível bancar o advogado do diabo, falar em tom de gozação, exagerar e usar hipérboles, tendo o objetivo de captar a verdade não em um único e equilibrado monólogo, mas para expor os pontos fortes e fracos de várias posições;
• "Sátira mordaz e crítica afiada" também são legítimas;
• espera-se que as melhores ideias para emerjam de uma mútua e impiedosa sondagem e ataque de argumentos, resultando na exposição de pontos cegos na visão, falhas nas teorias e inconsistências na lógica;
• os participantes são forçados continuamente a voltar à mesa e produzir melhores argumentos;
• a verdade não é entendida para ser localizada em qualquer posição única, mas para emergir da conversa como um todo.
O "debate" pseudo-intelectual
Ao longo do último meio século, o modo de debate pseudo-intelectual tornou-se cada vez mais enraizada nas universidades. A seguir, as dez de suas marcas registradas:
• "As pessoas e as posições são normalmente intimamente relacionados," com pouca insistência em manter a identidade pessoal separada das dúvidas ou questões em discussão;
• "Sensibilidade, inclusão, e ausência de ofensividade são valores fundamentais";
• prioridade na "cooperação, colaboração, tranquilidade, sedentarismo, empatia, igualdade, não-competitividade, conformidade e um foco comum";
• "parece ter falta de racionalidade e desafio ideológico" aos olhos dos defensores do debate moderno;
• tende a perceber a sátira e críticas ao debate moderno como "ataques viciosos e pessoais, impulsionadas por uma animosidade cheia de ódio";
• é orientado para "as medidas padrão de notas, ensaios, e um currículo bem definido";
• faltando "meios para negociar ou a acomodar diferenças intratáveis em seu modo de conversa", eles "normalmente recorrerão aos meios mais ferozmente antagônicos, demonizadores e pessoais de ultraje à oposição";
• "Normalmente tentam não responder os adversários com melhores argumentos, e sim tentam silenciá-los como 'odiosos','intolerantes','machões','misóginos','homofóbicos', etc";
• tem sabor mais feminino, ao contrário do sabor mais masculino do debate inteligente;
• resulta em "monólogos batidos" e contextos que "raramente produzem pensamento forte, tendendo a se tornarem câmaras de eco."
Quando perspectivas concorrentes colidem
Na guerra cultural dos dias de hoje, os "tomadores de ofensa " e "trolls " usam "escudos humanos" e acusações de "discurso do ódio" para silenciar oponentes. "Na falta de tolerância às diferenças e discordâncias, os debates orientados à sensibilidade dos participantes normalmente manifestam um efeito de pastoreio. Pode-se fazer bode expiatório ou excluir vozes dissidentes e os adversários podem ser fortemente atacados." Esta é apenas outra maneira de dizer que os defensores do modo pseudo-intelectual de debate tendem a se envolver em mentalidade de rebanho e suas decisões ser baseadas em popularidade / consenso.
A eliminação de Michael Mason do Queen's
Um historiador sênior chamado Michael Mason, aposentado da Universidade Concordia, em Montreal, morava em Kingston e ensinava em meio período no Queen's, onde os alunos geralmente o avaliavame como um excelente professor. Ele davaum curso de outono sobre "Ásia, África e América Latina desde 1945."
Em apenas duas semanas, um pequeno número de alunos na classe reclamaram dele ter feito "comentários racistas além do limite." Além disso, os assistentes de Mason o acusaram de usar "linguagem racista e sexista." O chefe de departamento e outros administradores entram em ação. Mason foi convocado para reunião, ameaçado com suspensão, e informado que o conselho monitoraria suas aulas e que o sistema de notas seria mudado. Os administradores julgaram que Mason "falhou em criar um espaço seguro" para os alunos, assim, violando a "Política de equidade educacional" da universidade. Seguindo o conselho de seu médico, Mason entrou em licença médica. Com efeito, ele foi forçado a deixar o cargo de instrutor para o curso, e isso foi o fim de sua carreira docente no Queens.
"Marginalização Acadêmica" é um termo muito chique para definir esta situação. Margaret Wente, em sua coluna no Globe & Mail, classificou o ocorrido como um "assalto". O mais fascinante sobre o ataque a ele é que ele não estava ensinando nada contencioso ou provocativo, ele estava apenas familiarizando os alunos com os registros históricos. Ele posicionava-se, além disso, contrário do racismo, e direcionava seu discurso para alertar os alunos ao racismo norte-americano no pós-guerra. A "ofensa" de Mason , se é que houve, foi ler em voz alta em uma aula uma passagem de um almirante americano chamando os japoneses de "amarelinhos filhos da puta." Da mesma forma, citando um artigo na revista Atlantic Monthly, Mason informou aos alunos que um senador dos EUA havia chamado a governadora da Carolina do Sul, uma mulher de origem Punjabi, de "mulherzinha de turbante". Mason não proferiu quaisquer xingamentos dessa natureza, ele apenas documentou o que alguns oficiais americanos tinham dito. Devido a isso ele foi acusado de fazer "comentários racistas além do limite."
As acusações de sexismo contra Mason foram igualmente tênues. Alegou-se que ele tinha dito que as estudantes do sexo feminino deveriam ser amantes. O que ele disse foi que ele queria que seus alunos se tornarem "mestres e amantes". Ele havia dito para os assistentes que na sua organização do curso não haveria muitas tarefas para dar a elas, e brincou dizendo que assim, talvez pediria a elas para lavar seu carro. Isto foi interpretado como uma ofensa às mulheres.
Mason, como a maioria dos professores de história contemporânea, via seu curso como uma arena de debate moderno. Era esquerdista o suficiente para incluir o racismo norte-americano como tema, mas sua prioridade era a comunicação de fatos históricos sobre o assunto, e não sentimentos pessoais ou identidades de seus alunos. No fundo, ele provavelmente sabia que caso houvessem estudantes de origem japonesa em sua classe, eles poderiam estremecer ao ouvir a declaração do almirante norte-americano, "amarelinhos filhos da puta", mas Mason assumiu que a cor da pele dos estudantes seria o bastante para tirar qualquer tipo de desconforto. O nome do jogo, como ele via, era aprender história.
Como as gerações de professores modernos antes dele, Mason considerou o domínio do assunto o principal objetivo do seu curso. Pode-se imaginar o seu sorriso maroto quando, inclinando-se para trás, para não ofender os estudantes do sexo feminino por linguagem sexista, ele proferiu essa frase, "mestres e amantes". Quanto à piada sobre pedir às alunas para lavarem seu carro, bem, piada é piada. Se Mason tivesse seriamente ordenado a elas pegarem baldes de água e levarem ao estacionamento para lavarem o carro após a aula, elas poderiam legitimamente oporem-se a este tipo de situação. Mas como poderiam opor-se a um modo divertido de comunicá-las que a quantidade de suas tarefas seriam relativamente poucas? Esse é o modo de debate tradicional que Mason parecia estar praticando.
Seus acusadores, pelo contrário, estavam envolvidos no modo pseudo-intelectual de debate. Eles não separaram, como Mason fez, o pessoal do pedagógico. Preservar a auto-estima e certificar-se de que todos os alunos da turma estivessem confortáveis assumia prioridade maior do que falar a verdade. Seus valores fundamentais eram "sensibilidade, inclusão e inofensividade." Talvez um ou outro dos alunos foi um "troll" à procura de racismo e sexismo escondidos, ansioso para expor esses vícios como prova da auto-justificação.
Em uma carta defendendo Mason, uma de seus ex-alunas, Helen Mo, escreveu: "Como a maioria dos excelentes professores, Mason usou citações, ironia, e outros artifícios retóricos em suas palestras de estilo socrático." Isso é típico do modo tradicional de debate, no qual as questões são sempre mais importantes do que as respostas. O debate pseudo-intelectual, pelo contrário, tende a ser mais literal, e raramente há muito espaço para o humor ou capricho. São as respostas que contam, mesmo que elas acabem em "monólogos batidos" e "câmaras de eco." Eu acharia que o desconforto da referência de Mason de "mestres e amantes" e a questão da lavagem de seu carro foram a deixa para que os alunos ofendidos mais tarde se queixassem. Eles esperavam que Mason se conformasse com uma "estrutura curricular bem definida." Ele falhou no teste. Portanto, eles se reuniram em uma pequena manada ameaçadora e fizeram um ataque "antagonista, demonizadora e pessoal" contra Mason, que terminou seu trabalho no Queens.
Mais três exemplos
Dezenas de casos de Marginalização Acadêmica no último quarto de século mostram o mesmo conflito de modos de debate. Em cada um deles, um professor ensinando de forma tradicional foi atacado por estudantes ou colegas que jogam no time do politicamente correto, utilizando um conjunto de regras feministas e vivendo em universo de perpétuo narcisismo emocional. Aqui, três exemplos:
• Na Universidade de Western Ontario, em 1991, o psicólogo Heinz Klatt cometeu o erro de injetar humor em sua classe de psicologia infantil. Ele chamou uma estudante chamada Lucretia de "Lucy, a sortuda". Ela achou o apelido encantador, mas outros quatro estudantes acharam humilhante para as mulheres, e Klatt, portanto, foi acusado de assédio sexual e de criar um "ambiente psicológico negativo ". Klatt passou os dois anos seguintes no que ele chamou de "Terra de Kafka".
• Na Universidade de Michigan, em 1992, o estatístico David Goldberg distribuiu em sala de aula um desenho animado que zombava de estatísticos como ele. Ele distribuiu outras apostilas ilustrando técnicas estatísticas aplicando as mesmas a dados reais, e algumas dessas técnicas mostravam diferenças por raça e sexo. Resultado: foi acusado de assédio racial e sexual!
• Em uma conferência na Universidade de Harvard em 2005, o então presidente Lawrence Summers ofereceu uma apresentação cuidadosamente fundamentada e suportada empiricamente sob a hipótese do porque das mulheres serem subrepresentadas nas faculdades de ciências e engenharia. O "desprendimento pessoal das questões em discussão" parecia ser impossível para um membro da plateia, no caso uma bióloga do MIT , a biscate feminista antihomem Nancy Hopkins, que liderou a campanha para que Summers fosse removido de sua posição em razão do sexismo. Summers voltou atrás em sua declaração, mas a campanha venceu.
Mais um exemplo: Philippe Rushton (1943-2012)
Philippe Rushton foi outro alvo Marginalização Acadêmica. O ataque a Rushton começou em 1989 e continuou pelo resto de sua vida, mesmo na ocasião de sua morte.
Rushton encarnava o debate tradicional. Praticamente todas as principais características listadas acima eram aplicáveis a ele, com a exceção da utilização de elementos literários como sátira e humor. Ele sabia sobre o assunto mais do que fazer piadas. Mesmo que sua prioridade fosse a explicação empírica da vida em termos de fatores históricos e culturais, ele poderia ter se metido em apuros com a esquerda pseudo-intelectual. Mas ele fez-se ainda mais vulnerável, fazendo das ciências naturais sua prioridade, buscando explicações através de fatores biológicos e genéticos, entre eles raça e sexo.
Rushton foi de temperamento moderado, de fala mansa e educada, sempre disposto a ouvir os argumentos dos adversários e responder friamente e racionalmente, citando provas. Era como se ele tornasse um famoso poema de Kipling em um script da sua vida acadêmica: "Se és capaz de manter a tua calma quando todo o mundo ao teu redor já a perdeu e te culpa; de crer em ti quando estão todos duvidando..."
Rushton foi um dos psicólogos mais citados no mundo. Em um artigo de primeira página no Ottawa Citizen em 2005, Andrew Duffy descreveu-o como o mais famoso professor universitário do Canadá (ele poderia ter dito infame). Além de tudo, a proeminência de Rushton justifica o esforço mais rigoroso para explicar por que a campanha feroz contra ele surgiu, por que os protestos de massa, investigações policiais, pedidos de demissão, restrições para suas aulas e pesquisas, denúncias incessantes na imprensa, e alijamento da vida acadêmica.
O desenrolar de um episódio de assédio moral depende não apenas os modos de debate de alvo e marginalizações, mas qual modo de debate está mais firmemente institucionalizado nas políticas universitárias e na legislação pertinente. O que John Furedy definiu de "totalitarismo veludo", em um artigo de 1997, não dependente apenas de inúmeros acadêmicos aderirem ao modo pós-moderno de debate, mas sobre a aplicação dos seus valores e prioridades por autoridade administrativa, agindo com base em regras escritas. No caso de Mason no Queens, valeu o fato da universidade ter uma "Política de equidade educacional" na qual parece se apoiar a prioridade pseudo-intelectual na sensibilidade e na inofensividade. Quando o manual da faculdade inclui disposições que colocam o conforto dos alunos à frente do rigor intelectual e da liberdade de expressão, os administradores não precisam ser pegos por uma campanha para derrubar um professor alvo, tudo o que eles têm a fazer é se comportarem como burocratas fiéis e seguirem o manual da faculdade. É por isso que a organização chamada FIRE (Foundation for Individual Rights in Education), a Fundação para os Direitos Individuais na Educação, tem perseguido uma longa sucessão de processos judiciais visando forçar faculdades e universidades a abandonarem o politicamente correto, os códigos de discurso feminista e as políticas anti-assédio que infringem as liberdades garantidas pela Constituição dos EUA. O objetivo da FIRE é para proteger o debate tradicional no ensino superior garantindo que haja apoio institucional para ele.
Impossível não ler o artigo e não lembrar de situações similares neste blog. (Inclusive, eu já fui um dos que criticou o uso intensivo do que chame de "ofensas gratuitas"). Eu sou de esquerda, por exemplo, mas me afastei por que a esquerda brasileira também acabou por assimilar este discurso (e, por favor, aos analfabetos políticos, não registrem isto como 'PT'; estou falando das universidades e movimentos sociais, como Movimento Sem Terra, Sem Teto e sindicatos. Sei que a maioria não sabe, mas a esquerda de forma geral deixou de apoiar o PT assim que Lula se elegeu pela segunda vez). E vejam, é um erro achar que este discurso pseudo-intelectual é inerente a esquerda, principalmente no Brasil. Na verdade, ele vem sendo assimilado nos últimos dez anos de forma mais forte. De outra, nós também devemos lutar para que a "desculpa" de que utilizamos um debate "tradicional" não nos torne simples revoltados sem argumentação. Do contrário, embarcaremos no mesmo barco do discurso pseudo-intelectual, mas com outro apelido. Eu lembro, por exemplo, de já ter contado aqui sobre como uma prima minha foi estuprada pelo cunhado e alguém argumentar que isso era só uma "historinha". Quero relembrar que devemos nos ater aos dados, e se a minha "historinha", como chamou o comentarista fanfarrão, não ilustra a maioria, também não pode ser desclassificada como fantasiosa. Enfim, são os males do debate pelo teclado.
ResponderExcluirEsqueci de 'assinar': Vagner da Rosa
ExcluirOk Vagner, vc não é um esquerdista idiota.
ResponderExcluirÉ só idiota mesmo.
Abs.
Para alguém que frequenta um blog voltado para homens, sua atitude é infantil e desprezível. Eu concordei com o texto e inclusive, disse que devemos nos ater fiel a ele. Mais que isto, eu disse que me afastei da esquerda por concordar com este tipo de coisa. Em que se baseia sua observação?
ExcluirAntes, os idiotas invejosos eram alunos que conversavam fiado de professor. Agora temos professores analfabetos funcionais esquerdopatas.
ResponderExcluirTigrinho, já compartilhei esse texto em alguns dos meus blogues.
Beijos